Movimento Roessler

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A história das mulheres do campo ou da cidade, entrelaçam-se em muitos pontos, seja no machismo diário, nas tentativas de silenciamento, o não direito sobre suas terras, sobre seus corpos. Esses entrelaçamentos também constrói a luta, como é o caso do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), que em novembro passado completou 40 anos. 

Menor das cinco regiões do país, com área territorial de 576 774,31 km², a região Sul é a segunda mais povoada do país. Formada por três estados – Paraná (PR), Santa Catarina (SC) e Rio Grande do Sul (RS), a região ocupa 6,76% do território brasileiro. 

Adriana Mezzadri, 45 anos, moradora da cidade de Charrua, região Noroeste do RS, está desde seus 14 anos militando no movimento. Assim com muitas outras mulheres o que a levou ao MMC foi perceber que era mulher e que podia ter direitos. “Eu era um ser humano de direito, que eu podia ver um mundo diferente, que eu não precisava só estar dentro de casa.”

Mãe de três filhos, ela pontua que começou a participar, na adolescência, das lutas pelos direitos ao salário maternidade e à saúde pública – que deveria ser um “direito de todos e dever do Estado”. Assim como por igualdade. “Há anos atrás, e hoje também, como a mulher dirigir, ir a certos lugares em determinados horários, ou querer estudar, era e continua sendo, em diferentes momentos, há questionamentos por ser mulher.”

A luta pela terra 

Na luta pela terra, Adriana destaca que só 19% de mulheres têm a terra em seu nome, por mais que se tenha avançado na questão da reforma agrária. Para ela, o machismo e o patriarcado podem ser vistos nessa questão da terra. “Por exemplo, de herança, poucas mulheres têm acesso à terra por essa via, a maioria fica com os homens.”

Conforme enfatiza, a luta pela terra, pelo território são importantes, ainda mais se levar em conta a questão do agronegócio, as transnacionais. “O agro, o hidro, o minério têm tomado bastante espaço no nosso território, e bastante recursos financeiros, ambientais, sociais, o que causa um grande impacto. A nossa luta pela soberania alimentar, pela alimentação saudável, pela reforma agrária popular, com certeza tem muito a ver com ter acesso também à terra, poder produzir alimentos saudáveis.” 

Efeitos do clima 

O Sul foi atingido no segundo semestre 2023 por catástrofes climáticas, em especial as enchentes no RS, diferente do quadro que tem se observado na Região Amazônica. Esse efeito climático tem afetado drasticamente a agricultura e produção local daqueles que se dedicam ao campo. “Nós viemos de dois anos de seca, onde a produção de alimentos para consumo foi bastante comprometida. E agora com esse excesso de chuva também, quando se consegue plantar, as plantas não se desenvolvem. Isso também nos atinge de forma cruel, porque tem alimentos, que se a gente não produz, a gente acaba não tendo condições de comprar para agregar na alimentação”, expõe. 

Em sua avaliação esse desequilíbrio ambiental tem a ver com o modelo de desenvolvimento, que não respeita a vida das pessoas, não respeita a natureza, o planeta. “Nós dizemos na Via Campesina que só os camponeses que vão conseguir esfriar o mundo, com a distribuição da terra, com a reforma agrária, com a produção de alimentos saudáveis, a soberania alimentar pra todos os povos.”

Para ela, o que diferencia a mulher do Sul para outras regiões é a situação de vida e a questão ambiental. “O desafio de construção acaba sendo bastante parecido, às vezes do acesso à educação. Tem vários desafios que continuam. Por exemplo, a disputa do território se dá muito na Região Amazônica, no Nordeste, por toda a questão da seca que eles convivem o tempo inteiro, como produzir alimentos sem acesso à água, sem acesso à terra, é bastante desafiador”, pontua. 

Machismo 

“A questão do machismo perpassa o conjunto, nós vivemos em um momento que o fascismo, o conservadorismo ganha muita força. Então coisas que nós ouvíamos lá nos anos 1980, nós voltamos a ouvir agora, que o nosso lugar não é na rua, é em casa. O nosso lugar é onde a gente quiser, construindo a luta popular, construindo a luta com política pública, é onde a gente quiser. A gente organizada afirma esse processo e demonstra pra sociedade que é possível.”

Conquistas 

Nas quatro décadas de movimento, Adriana destaca como uma grande conquista a conscientização de direitos das mulheres. “De ser um ser humano de direitos, de perceber que não precisa viver com violência, de lutar contra um modelo concebido. E também de construir a organização de base, autônoma, e aí construindo com o conjunto da classe trabalhadora, a construção da unidade de uma sociedade. A gente sabe que se as mulheres se libertarem e libertarem a classe trabalhadora, não vai acontecer o capitalismo. Nós podemos transformar a sociedade, e no dia a dia nós podemos construir essa transformação.”

Para ela o grande desafio é continuar construindo organização das suas diversas formas, e trazendo informação de consciência, disputando o coração e a mente de todos, todas e todes. 

Fabiana Reinholz, jornalista
Brasil de Fato | Porto Alegre

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